Resenha: Nove Noites

Essa semana terminei de ler Nove Noites, um livrinho de 150 páginas que demorei um mês pra finalizar. Mas vamos por partes.

No dia do seu vigésimo sétimo aniversário, ele me disse que sabia o que era a morte: um excesso que se anula. É ficar mais cansado que o cansaço permite, exceder as próprias condições, reduzir-se a menos que zero, ultrapassar as vinte e quatro horas de um dia sem chegar ao dia seguinte.

Nove Noites foi escrito por Bernardo Carvalho e ganhou os prêmios Portugal Telecom (2003) e o Machado de Assis para melhor romance do ano (2003). Nele, dois narradores - Manoel Perna e o próprio Carvalho - intercalam suas falas para contar a história de vida, e principalmente de morte, de Buell Quain, antropólogo estadunidense que se suicidou no Brasil em 1939, aos 27 anos, enquanto retornava de uma aldeia indígena onde passou seus últimos dias. 

Buell Quain


Apesar dessa história ser real, o livro Nove Noites é uma mistura entre ficção e realidade, entre narrativa e verdade, onde o leitor se coloca à deriva e perde as fronteiras entre o que foi e o que poderia ter sido, tentando responder uma questão que pode ser tudo menos simples: Por que ele se matou?

É preciso entender que cada um verá coisas que ninguém mais poderá ver.

O autor também intercala a sua própria biografia com a de Quain, fornecendo uma obra dupla, nem sempre fácil de acompanhar. Essa foi uma das partes que eu mais gostei na obra e acredito que colaborou para o seu sucesso.

Via-se como um estrangeiro e, ao viajar, procurava apenas voltar para dentro de si, de onde não estaria mais condenado a se ver. Sua fuga foi resultado do seu fracasso. De certo modo, ele se matou para sumir do seu campo de visão, para deixar de se ver.

Grande parte do livro se passa entre povos indígenas e o autor possui uma visão interessante sobre os mesmos. Ele considera cada indígena enquanto indivíduo, e não como um mero integrante de um grupo genérico, como tantas vezes abordados na literatura. Um grande exemplo disso é como sempre são citados os nomes deles, jamais relegados a classificações como "um índio". A obra apresenta muitas facetas da cultura indígena dos povos Krahô e é bastante rica nesse aspecto, foi inclusive isso que me chamou a atenção. Uma crítica pessoal é que algumas vezes os Krahô aparecem em uma posição um tanto infantilizada e não sei dizer se essa é uma visão do personagem ou do autor.

Cada um lê os poemas como pode e neles entender o que quer, aplica o sentido dos versos à sua própria experiência acumulada até o momento em que os lê.

Apesar de ter me interessado muito, demorei horrores para terminar o livro porque achei difícil me prender à história, principalmente por conta dos narradores intercalando as falas. Ainda assim, é uma leitura que recomendo a todos que se interessam por povos indígenas e narrativas originais (e a originalidade de Nove Noites é inegável).

Talvez caiba um trocadilho: Nove Noites, um livro para ler em 30 dias. 😝


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